Nelson Gonçalves: noites de saudade

"Boemia, aqui me tens de regresso
E suplicante te peço a minha nova inscrição.
Voltei pra rever os amigos que um dia
Eu deixei a chorar de alegria; me acompanha o meu violão.
Boemia, sabendo que andei distante,
Sei que essa gente falante vai agora ironizar:
"Ele voltou! O boêmio voltou novamente.
Partiu daqui tão contente. Por que razão quer voltar?""


Falar de Nelson Gonçalves é simples: foi simplesmente a voz masculina mais poderosa de nossa música popular brasileira. Se tivesse nascido nos Estados Unidos, com certeza seria lembrado nos dias atuais como sendo uma das maiores vozes da humanidade de todos os tempos. Frank Sinatra seria, no máximo, seu back vocal.

Antônio Gonçalves Sobral nasceu em Santana do Livramento, RS, em 21 de junho de 1919. Seus pais, imigrantes portugueses, tinham acabado de chegar ao Brasil quando Tonico (apelido que recebeu) nasceu. Quando o menino completou 6 dias de vida, mudaram- se para São Paulo, instalando- se no bairro do Brás.

Pouco chegado ao trabalho, Seu Manoel tocava violino nas feiras - livres da cidade, onde tentava arrecadar alguns trocados. Para acompanhá- lo, levava o filho para cantar. Tonico tinha 6 anos nessa época. 

A gagueira renderia a Tonico outro apelido: Metralha, pois falava cuspindo as palavras como uma metralhadora. Durante esse tempo foi jornaleiro, engraxate, mecânico, polidor e tamanqueiro. E é com o apelido de Metralha que muda-se para Taubaté e se torna boxeur. Com 17 anos recebe a faixa de Campeão Paulista dos Meio-Médios, após vencer 24 lutadores por nocaute e ter perdido apenas duas vezes, por pontos. Foi então estudar canto acadêmico por seis anos com o maestro Bellardi, que lhe explicou que não era gago, era taquilárico (do grego takimós: respiração curta, acelerada). E foi o maestro que lhe aconselhou a ser cantor popular.'

Como Antonio não era um nome sonoro, os amigos do Brás lhe sugeriram que usasse o nome Nelson, mais melodioso. Fez um teste e foi reprovado, pois, na hora de cantar a voz não saia, e Nelson emudeceu. Na semana seguinte nova tentativa, dessa vez um sucesso, cantando a mesma música que tentara na semana anterior, "Chora Cavaquinho", de Dunga. Contratado pela PRA-5 casa-se com Dona Elvira Molla, com quem tem dois filhos. Com a guerra, a rádio promove cortes em massa, e Nelson perde o emprego, indo trabalhar como garçom.

Decide tentar a sorte no Rio de Janeiro, onde é reprovado sucessivamente em diversos programas, inclusive por Ary Barroso, que o aconselha a voltar para São Paulo e desistir da carreira de cantor. Arrasado, ele volta a São Paulo, onde consegue um convite para gravar uma valsa de Orlando Monella e Oswaldo França, "Se Edu Pudesse Um Dia". Com a prova da gravação volta até o Rio e mostra o trabalho na RCA Victor. Foi contratado. Nascia, à partir deste momento, o mito Nelson Gonçalves.

Daí para o estouro foi um minuto. Em 43, consegue emprego como crooner do Cassino do Copacabana Palece Hotel, após o estrondoso sucesso de Renúncia, de Roberto Martins e Mário Rossi.

O sucesso só aumentou. Separado de sua primeira esposa, casou-se novamente em 1952 com a cantora Lourdinha Bittencourt, que foi a segunda substituta de Dalva de Oliveira no Trio de Ouro. E é nesse mesmo ano que conhece seu maior parceiro: Adelino Moreira.

De 1958 a 1966 inicia-se seu declínio pelas drogas - cheirava cocaína todos os dias. Em 1959 Lourdinha o abandona e em seguida ele é preso por porte de drogas. Casa-se pela terceira vez em 65 com Dona Maria Luiza da Silva Ramos, na época sua secretária, e com a ajuda dela decide abandonar as drogas e retornar a sua carreira. Maria Luiza seria seu grande amor e sua companheira pelo resto da vida.

Sem gravar desde 1968, finalmente a RCA o chama para gravar um disco em 1971. Daí pra frente Nelson foi juntando seus pedaços, se reestruturando, retomando o respeito de seu público. Nos anos 80 gravou com a nova geração da MPB e nos anos 90 com diversos grandes nomes do rock nacional. Nelson Gonçalves, mesmo passando por tantos problemas, conseguiu construir uma das mais sólidas carreiras de nossa música popular brasileira. Foi recordista de vendas e um dos mais admirados artistas de toda a história de nossa canção.

Em 1997, Nelson começou a perder a voz, e a possibilidade de não poder mais cantar o deixou bastante deprimido. No seu último disco, nota- se que a voz de Nelson já não era a mesma, embora tivesse o mesmo brilho. Mesmo com a voz enfraquecida, colocava qualquer outro cantor mais novo no bolso, tamanho o poder de sua voz. Morreu em 18 de abril de 1998, vítima de um infarte.

Deixou a vida para entrar na história. Ao contrário do que ele próprio pensava e dizia, se tornou um imortal


Dedico este Cartaz Musical ao meu saudoso avô, Expedito Evaristo Alves, que era apaixonado pela voz do Nelson Gonçalves e transmitiu a todos nós este amor por suas canções.




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