5ª Cult, uma noite de puro Samba

Os cantores monlevadenses Rômulo Ras, com sua banda e Nadja Lírio e o Samba Na Sola, deram sem recado de maneira brilhante. De Cartola à Clara Nunes, o Samba foi a grande estrela da noite.
(Rômulo Ras)

(Nadja Lírio)

"O samba é mal de raiz
Quem é de samba é quem sabe o que diz
O samba lava a cicatriz
Quem samba não fica infeliz
O samba é sinal de paz
Quem é de samba é quem sabe o que faz
O samba não perde o cartaz,
Nunca jamais."
(Wilson das Neves e Paulo César Pinheiro)

O grande Nelson Sargento sempre estará certo quando diz que o Samba agoniza mas não morre. A noite de ontem, na sede do Sindicato dos Metalúrgicos de João Monlevade não o deixa mentir. O seleto público presente no local foi presenteado com uma noite de puro bom gosto musical, e pôde se deliciar com o melhor da verdadeira arte de nossa gente.

Pérolas do nosso Samba foram interpretadas lindamente pelos artistas e pela fantástica banda, que dentre outros conta com José Antônio Pereira e seu filho, Rafael Castro, um dos melhores músicos que conheço e que foi baterista da extinta banda Asas Noturnas, da qual eu era o intérprete.

Rômulo Ras vem de uma família onde a música corre nas veias. Sobrinho de nossa artista maior, a saudosa e sempre lembrada Neide Roberto, Rômulo já conta com 30 anos de uma sólida carreira constituída sobre a base do bom gosto musical.

 Nadja Lírio, monlevadense radicada no Rio de Janeiro, é filha da professora e vereadora Dulcinéia Lírio Caldeira, e além do bom gosto na escolha do repertório, demonstra um bom talento musical.

 Na ocasião, pude bater um papo com a cantora Nadja Lírio e outras pessoas presentes que relembraram Clara Nunes, a cantora mineira, falecida em 1983 aos 39 anos, e que foi uma das homenageadas da noite.

 Nadja, que a cerca de três semanas realizou um show inteiro em homenagem a Clara Nunes, em Saquarema, no Rio de Janeiro, ressaltou, em nossa conversa, a importância de Clara Nunes como sendo a sua maior referência dentro da Música Popular Brasileira. A cantora disse que além de maior representante feminina da MPB, Clara, foi também, a maior intérprete de música regionalista de nosso país. No repertório da Nadja estavam "Ijexá", "Emabala Eu" e "Juízo Final".

A professora e vereadora Dulcinéia Caldeira, mãe de Nadja Lírio, fez questão de dizer que Clara Nunes foi uma artista ímpar. "Mineira, guerreira, Clara incorporou o afro - samba como ninguém, demostrando grande respeito à cultura afro de modo geral. Tinha uma voz maravilhosa, e é uma artista por quem tenho enorme respeito", disse Dulcinéia.

A fotógrafa, escritora e vencedora de um dos Festivais da Canção de João Monlevade, além de funcionária do Banco do Brasil, Lutécia Mafra Espeschit, lembrou que Clara Nunes preencheu a lacuna deixada por Carmen Miranda, de maniera atual e carismática. Assim como Dulcinéia Caldeira, Lutécia fez questão de ressaltar a importância de Clara para a divulgação e valorização da cultura afro. "Clara Nunes construíu um estilo próprio e único, através de uma indumentária criada por ela. Além de inovar o Samba, Clara Nunes, colecionou grandes sucessos. Se Clara, Elis e Elizeth estivessem aqui, o cenário musical com certeza seria outro. Eu particularmente, me identifico mais com Elis, porém, dentro do Samba, Clara é inigualável.Essas três  são únicas e insubstituíveis. Hoje ainda temos Alcione representando o Samba, pois Beth Carvalho embora grande sambista, não tem na mídia a mesma projeção que Alcione, porém nenhuma delas consegue superar Clara Nunes, pois ela foi e é a mais importante sambista que já tivemos", ressaltou Lutécia.

Já o jornalista e ativista cultural Marcelo Melo, do jornal e site Morro Do Geo e Blog Do Leuman, lembrou - se de que Clara Nunes, no início de sua carreira, nos anos 60, era figurinha carimbada em João Monlevade, e que realizou muitos bons shows por aqui. Melo disse que a "Mineira" foi um grande fenômeno, desde que surgiu na mídia. "Clara Nunes é para o Samba o que Elis Regina é para a MPB. Através da cultura e dos rítmos afros, ela mudou o cenário musical brasileiro. Clara conseguiu juntar a linda voz ao grande carisma e a um estilo único de música. Foi ela, quem abriu as portas para as demais cantoras, que vieram depois cantando Samba. Beth Carvalho, Alcione, Simone, Leci Brandão devem muito a Clara Nunes. Até mesmo Clementina de Jesus, que embora fosse muito mais velha, conseguiu um espaço maior depois que Clara abriu o caminho. Apesar de mineira, integou a Bahia ao seu estilo, criando um elo afetivo. Falar de Samba, é falar de Clara Nunes. Ela era única dentro de seu estilo, imortalizando sua obra e seu carisma. Era uma mescla de musicalidade e beleza, e deu uma cara nova ao Samba. Mudou a história do gênero. Clara Nunes foi, e é, a grande voz feminina do Samba", disse Marcelo Melo, que ainda se lembrou da perfeita união do amor e musicalidade de Clara Nunes com o poeta Paulo César Pinheiro, com quem foi casada de 1975 até sua morte prematura em 1983.

Em nosso bate papo, eu e o amigo Marcelo Melo, nos lembramos também, do pedido de Clara Nunes ao seu marido, Paulo César Pinheiro, para que ele compuzesse uma música falando da Portela, sua Escola de coração. Segundo Clara, após "Foi Um Rio Que Passou Em Minha Vida", grande sucesso de Paulinho da Viola, nenhuma outra música a suparara. Melo se lembrou de uma entrevista em que Pinheiro se recorda de que teve o sonho de fazer a música falando da Portela dentro da avenida, já que Paulinho da Viola fala da Escola de Samba fora da avenida. Eu contei ao Marcelo que o Paulo César Pinheiro, disse a Clara que sería difícil para ele fazer uma música para a Portela, uma vez que ele era Mangueira. Parado diante de um altar que Clara tinha na sala de sua casa, viu a imagem de Nossa Senhora Aparecida, vestida com seu manto sagrado, na cor azul, a cor da Portela. Daí veio a inspiração, e Paulo César Pinheiro, uniu o santo ao profano, e saiu um dos mais lindos sambas da história da MPB, "Portela Na Avenida", eternizada na voz de sua "Sabiá", um dos apelidos de Clarinha.

A 5ª Cult em homenagem ao Samba, é mais uma noite para entrar na história cultural de nossa tão amada João Monlevade. Que venham outras noites como essa. Parabéns aos organizadores do evento.

3 comentários:

  1. Obrigada por ter usado as fotos que fiz com tanto carinho... E belo texto... Abraços!! Ronara Reis.

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  2. Ei Rosana, eu que agradeço por sua arte. Ficaram lindas as fotos. Obrigado por tudo. Conte sempre comigo e com o Visão Geral. Abraços.

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  3. Foi hoje que li sua resenha sobre o 5ª Culto do samba, Caio. Valeu, sô. Excelente texto. Pois é, rapaz. Estamos tentando criar uma marca de qualidade pro 5ª Cult e textos como o seu nos fazem perceber que estamos no rumo certo. Um abraço.

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